Dr. Rodolfo Leandro de Faria Olivo – PHD em Administração pela FEA – USP e Professor da FIA Business School
e Ronaldo Corrêa Martins – Mestrando da FIA em Gestão de Negócios
Neste artigo procurou-se trazer para o debate das finanças, um olhar diferente para o peso da carga tributária na apuração dos lucros apurados pelas entidades empresariais, bem como a sua subsunção ao compliance corporativo, em função da relevância e importância no impacto na rentabilidade em seus negócios.
Quando pesquisamos dados e informações sobre o valor de uma empresa, surgem vários questionamentos, tais como: Como investir? Onde investir? Devo comprar ações de que empresa? Qual o valor de uma empresa? Qual o valor de uma empresa deve ser considerado na aquisição ou fusão de empresas?
Os investidores, analistas financeiros e especialistas em aquisições e fusões, utilizam muitos métodos de avaliação das organizações para tomada de decisão do investimento.
Dentre os principais métodos de avaliação de empresas, os mais utilizados pelo mercado são os seguintes:
- Avaliação por Valor Patrimonial;
- Avaliaçãopor Valor de Mercado;
- Avaliaçãopor Múltiplos;
- Avaliaçãopor Fluxo de Caixa Descontado.
Cada um deles tem suas particularidades e importância para cada fase da empresa, da negociação ou da transação que se pretende fazer.
Entretanto, além dos critérios técnicos acima mencionados, devem ser considerados os cenários geopolíticos e econômicos, que afetam diretamente o custo de capital das empresas. (Damodaran, 2022), ou as políticas de sustentabilidade através do denominado “ESG”, que afetam diretamente o valor de uma determinada empresa.
Porém, será que somente esses métodos são suficientes para apurar a rentabilidade e valor de uma empresa?
O que verificamos, é que todos os métodos partem de dados existentes, publicados pelas entidades empresariais, e constantes das demonstrações financeiras (fontes: relatórios e demonstrativos das empresas, DRE, balancetes e balanço patrimonial).
Portanto, avaliam a rentabilidade a partir dos dados estáticos, uma fotografia numa data base. Esse fato vem corroborado pela nota constante do material veiculado pela FIA (2021), como segue: “Indicadores financeiros são medidas quantitativas que revelam a situação financeira de uma empresa com base em seus resultados contábeis. São excelentes ferramentas que ajudam tanto o gestor em sua tomada de decisão quanto o investidor que está em busca da melhor relação risco x retorno para seu capital.
Os indicadores se baseiam em dados históricos, ou seja, no desempenho passado.” (grifo nosso)
Assim, surge outro questionamento: referidos dados estão corretamente representados e são validados por critérios técnicos – científicos ou mesmo empíricos?
Segundo Assaf Neto (2019), “Os temas Valuation e criação de valor passaram a ter maior importância no Brasil principalmente após o período de privatizações de empresas e abertura econômica, ocorrido a partir da década de 1980. A globalização demonstrou na prática que as empresas devem apresentar capacidade de produzir valor econômico para atrair investimentos e para justificar sua existência econômica. Essa realidade trouxe novos parâmetros para a avaliação de empresas no Brasil, tornando o valor apurado mais confiável e próximo dos investidores.”
Dessa forma, este artigo procura debater um novo método a ser considerado: um novo olhar sobre a carga tributária das empresas, que afeta diretamente o lucro, a rentabilidade e a distribuição dos lucros e dividendos.
Para tanto, a trilogia financeira proposta leva em conta a carga tributária, o compliance corporativo e os lucros, como métodos de validação deste último elemento, e todos os demais indicadores deles decorrentes.
Neste momento, segundo nossa avaliação, dada a relevância, identificamos a primeira crítica aos modelos em discussão, pois a carga tributária afeta, diretamente, os indicadores da Margem EBITDA e Margem Liquida, utilizadas como indicadores para aferição da rentabilidade da empresa. Basta verificar a composição desses indicadores, que no primeiro não considera os tributos pagos pelas entidades, bem como, o segundo, que consideram o lucro líquido, deduzido os tributos. Porém, neste último somente consideram os impostos corporativos – IRPJ e CSSL, já que os demais foram deduzidos para apuração do lucro bruto, nas DRE (Demonstração do Resultado do Exercício)
- Margem EBITDA = EBTIDA/faturamento *100
- Margem Líquida = Lucro/Receita Líquida*100
Além desse impacto, a relevância e importância na apuração do lucro é evidente quando analisamos os indicadores da rentabilidade das empresas, tais como o ROE, ROIC E ROA.
Mas o que vem a ser essas sopinhas de letras? E qual a importância e vínculo com a trilogia financeira?
Para as finalidades e compreensão deste artigo, vamos explicar cada um desses indicadores, utilizando os conceitos simplificados de Bozza, Stéfano (2020) e do material publicado no blog da FIA, no sítio https://fia.com.br/blog/indicadores-financeiros/
ROE, ROIC e ROA: o que significa cada múltiplo fundamentalista?
Em primeiro lugar, você deve entender que as três siglas representam uma análise de rentabilidade. Isso significa, em outras palavras, que temos três óticas diferentes para avaliar o retorno oferecido por um investimento.
Vamos começar entendendo o que essas siglas representam para compreender como utilizá-las a nosso favor na hora de avaliar as companhias.
Como analisar ROE é ROA?
Estes indicadores podem ser calculados com as seguintes fórmulas:
- ROE = Lucro Líquido / Patrimônio Líquido.
- ROIC = NOPAT / Capital Investido.
- ROA = Lucro Líquido / Ativo Total.
Para que serve o ROE?
O ROE é um indicador que mede a capacidade que uma empresa tem de gerar valor ao negócio e aos investidores com base nos recursos que a própria empresa possui.
Essa métrica pode ser usada tanto por administradores de empresas, gestores de investimentos ou investidores em geral.
O ROE é a mais conhecida dessas métricas de rentabilidade. Ele significa Return on Equity ou, se preferir, “Retorno sobre o Patrimônio Líquido” em tradução livre.
O Patrimônio Líquido é o nome dado ao valor que a empresa possui como investimento inicial dos seus sócios somado aos seus acionistas, assim como ganhos e perdas dos seus resultados.
O ROE, portanto, oferece a possibilidade de avaliar se uma empresa consegue gerar valor com base no uso dos seus próprios recursos. Este indicador pode ser calculado com a seguinte fórmula:
ROE = Lucro Líquido / Patrimônio Líquido
O que é um bom ROE?
Atualmente os principais gestores do mercado consideram um bom ROE aquele acima de 15% ao ano. No entanto, esse valor não é taxativo, servindo apenas como parâmetro de análise. Além disso, é importante frisar que, para efeitos de comparação, utiliza-se sempre empresas do mesmo segmento.
ROIC: Return on Invested Capital
A nossa segunda métrica é o ROIC (Return on Invested Capital), que representa o retorno sobre o capital investido. Isto é, este indicador vai nos oferecer qual é a eficiência de uma companhia em gerar lucro com o dinheiro que tem disponível para investir.
Aqui, ao contrário do ROE, podemos contemplar também o capital de terceiros (como empréstimos, financiamentos e títulos de dívida). Ou seja, se há uma emissão de debêntures para investir em um novo projeto, por exemplo, esses recursos devem ser contemplados na métrica.
Para encontrar o ROIC, o cálculo é realizado com base no NOPAT (Net Operating Profit After Taxes), que é o Lucro Operacional gerado pela Companhia após o pagamento dos impostos. Desta forma, a fórmula utilizada é a seguinte:
ROIC = NOPAT / Capital Investido
Vale destacar, ainda, que o ROIC, embora tenha sigla parecida, não é a mesma coisa que o ROI. Este outro indicador avalia o retorno de um investimento isolado — algo que, quando pensamos em análise de uma empresa para investimento de longo prazo, tem menor relevância.
O que é NOPAT na contabilidade?
NOPAT é uma sigla em inglês para Net Operating Profit After Taxes, ou seja, lucros líquidos após os impostos. Este indicador mede a capacidade de uma empresa de gerar receita, e seu desempenho, afim de determinar se ela é lucrativa.
Como se calcula o NOPAT? NOPAT = EBITDA X (1 – T)
Neste caso, o DRE é bem simplificado e o Lucro Operacional é igual ao EBITDA. Para calcular o NOPAT, vamos multiplicar o valor de R$ 2.700,00 por um menos a alíquota de IR e CSLL (nesse exemplo 34%). Então, NOPAT = R$ 2.700,00 * (1-34%) = R$ 1.782,00.
ROA: Return on Assets
Já o ROA (Return on Assets) representa o retorno obtido pela companhia com seus investimentos em relação ao seu ativo, que é o total que a empresa possui entre seus bens e direitos.
Referida métrica possui o diferencial de mesclar as fontes de capital que vimos anteriormente. Ou seja, você pode ter ativos obtidos pelo capital dos sócios e acionistas, assim como o capital de fornecedores e instituições financeiras, como os bancos.
O cálculo é bastante simples e indica a capacidade de valorizar os ativos que uma empresa possui. Veja só a fórmula utilizada para encontrar o ROA de um negócio:
ROA = Lucro Líquido / Ativo Total
Como analisar os indicadores de ROE, ROIC e ROA para investir?
Agora você já conhece os principais indicadores de rentabilidade de uma Análise Fundamentalista, assim como suas respectivas fórmulas para cálculo.
Uma vez que todos os indicadores tratam da capacidade de gerar lucro, naturalmente que os resultados podem ser encarados sob a ótica do “quanto maior, melhor”. No entanto, essa é uma avaliação muito superficial.
E aqui verificamos a ligação entre os objetivos traçados neste artigo com as métricas acima apresentadas e a trilogia financeira. Tudo tem afetação e fundamentação no lucro apurado pelas entidades empresariais.
Portanto, carga tributária, compliance corporativo e lucro, são elementos fundamentais para validade na apuração do lucro, seja o bruto ou líquido, e sua utilização pelos indicadores de Margem EBITDA, Margem Liquida, ROE, ROIC e ROA, para decisão de investir.
Para aqueles que quiserem aprofundar os estudos sobre a distribuição dos lucros e dividendos, podem ler O ENIGMA DOS DIVIDENDOS E O RISCO SISTEMÁTICO, de Bernardo, Heloísa Pinna, Ikeda, Ricardo Hirata, in Revista Universo Contábil. ISSN 1809-3337, Blumenau v. 9, n.1, p. 104-120, jan/mar. www.furb.br/universocontabil
Assim, gerir muitos tributos, acompanhar as mudanças da legislação em vários âmbitos, definir a correta incidência dos tributos de acordo com as operações do negócio, e estar em conformidade dentro desse universo tão complexo, são as dificuldades encontradas no dia a dia dos dirigentes, executivos e profissionais da área tributária, financeira e de estratégia das empresas.
Um dos elementos fundamentais para analisar a carga tributária – além dos programas de conformidade tributária é o Planejamento Tributário, na medida em que tangência a linha da evasão fiscal. A análise desse mecanismo deve considerar e evitar a prática do planejamento abusivo, juntamente com os conceitos de evasão fiscal e elisão fiscal. Esses são elementos que fazem parte da análise adequada do denominado Planejamento Tributário lícito e legal.
Portanto, para Costa e Amorim Júnior (2020), “planejamento tributário é uma forma estratégica de aumento de competitividade, de lucratividade e, muitas vezes, de viabilidade do negócio, sendo, por última consequência, uma forma de se obter recursos internamente. Desse modo, a redução de carga tributária oriunda desses instrumentos pode ser um propulsor potencial para a realização do negócio.”
Segundo Minnick e Noga (2010) “Examinar a ligação entre governança e planejamento tributário (versus outros aspectos das decisões operacionais de uma empresa) é interessante por duas razões. Em primeiro lugar, o planejamento tributário pode ser complexo e opaco e pode possivelmente permitir oportunismo gerencial. Entender o papel que a governança desempenha na gestão fiscal torna-se, portanto, mais importante. Em segundo lugar, o planejamento tributário envolve incerteza significativa, e pode não beneficiar imediatamente o desempenho de uma empresa; em vez disso, serve como um investimento de longo prazo. Ao entender como a governança está relacionada à gestão fiscal, conseguimos uma melhor compreensão de como funciona a governança no longo prazo e no curto prazo.”
Ainda, segundo Minnick e Noga (2010), “Diretores e CEOs desempenham um papel fundamental na escolha de uma estratégia de gestão tributária; eles são responsáveis pela alocação de recursos, desempenho e aumento da riqueza dos acionistas. Os diretores têm um número finito de escolhas em termos de como alocar recursos e melhorar o desempenho. Um conselho interessado na melhoria do desempenho de primeira linha concentra-se principalmente no crescimento das vendas por meio de publicidade ou expansão física (capital) e desviará recursos para essas metas. Alternativamente, eles também podem optar por se concentrar no desempenho final. A gestão fiscal eficaz é um fator importante de desempenho financeiro; quando o conselho investe recursos em atividades de maximização de valor, como planejamento tributário, o resultado é: impostos mais baixos e melhor desempenho nos resultados.”
Conclusão
Este artigo procurou evidenciar o papel da carga tributária, corroborada pela subsunção às normas legais e aos princípios da governança corporativa, na apuração do lucro das empresas, elemento fundamental para validade de sua utilização nos indicadores de medição da rentabilidade e valor das empresas.
Não poderíamos deixar de acrescentar mais uma discussão, para reflexão: será que a Gestão Tributária não deve fazer parte das estratégias das empresas, sob supervisão dos órgãos controladores e executivos das empresas?
A gestão estratégica das organizações é um dos campos mais instigantes da administração e finanças, por proporcionar a necessidade de aplicação de uma visão de longo prazo e sustentabilidade dos negócios. Além disso, com o aumento da concorrência em todos os setores, o processo de globalização e a disponibilidade infinita de informação, o processo de pensamento estratégico deve estar fluindo de maneira permanente nas organizações.
Quais os processos organizacionais que devem ser considerados na maneira como empresários, executivos e gestores gerenciam os negócios, considerando o dinamismo do atual contexto social e econômico?
Bibliografia
Costa, Fábio Moraes da e Amorim Júnior, Radjalma Lucena: Revista Evidenciação Contábil & Finanças, v. 8, n. 3, p. 5-22, Setembro-Dezembro, 2020. 18 páginas.
Kristina Minnick, Tracy Noga: Do corporate governance characteristics influence tax management? In Journal of Corporate Finance, Volume 16, Issue 5, 2010, Pages 703-718, ISSN 0929-1199, https://doi.org/10.1016/j.jcorpfin.2010.08.005. (https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S092911991000060X)
Damodaran, 2022 – NEOFEED: revista semanal. São Paulo: Ed. de 12/04/2022)
Entenda o que é return on equity e saiba como ele é importante para suas finanças
Bernardo, Heloísa Pinna, Ikeda, Ricardo Hirata. O ENIGMA DOS DIVIDENDOS E O RISCO SISTEMÁTICO. Revista Universo Contábil, ISSN 1809-3337, Blumenau, v. 9, n. 1, p. 104-120, jan./mar., 2013. Dói: 10.4270/ruc.2013106. www.furb.br/universocontabil
Bozza, Alexandre. Formado em Administração pela PUC-SP, trabalhou em empresas do segmento financeiro (Itaú BBA) e varejo (BRMALSS) até 2016, quando iniciou a jornada de produção de conteúdo para a internet com foco em finanças. Artigo publicado em 24/11/2020, no blog do sítio https://maisretorno.com/portal/qual-a-diferenca-entre-roe-roic-e-roa-quando-usar-cada-multiplo-fundamentalista
Indicadores financeiros: O que são, os principais e como analisar. https://fia.com.br/blog/indicadores-financeiros/
Deloitte: Pesquisa – Tax Transformation Trends: Operações em foco: reforçar o valor estratégico em um ambiente de transformações, maio de 2021, disponível em Pesquisa Tax Transformation Trends | Deloitte Brasil