A pandemia do COVID 19, combinado com os avanços tecnológicos, fizeram com que o trabalho em home office ganhasse maior protagonismo e aderência por empresas de diversos setores e segmentos, até mesmo porque o trabalho remoto foi (ou seja) a única solução para a manutenção das atividades empresariais e laborais, haja vista que somente os serviços essenciais estavam autorizados ao funcionamento.
Inicialmente, é necessário destacar que o trabalho em home office não está previsto na legislação.
Os artigos 75-A até 75-E da Consolidação das Leis Trabalhistas regulamentam o teletrabalho, e são os únicos dispositivos legais que mais se assemelham ao trabalho em home office, sendo utilizado de forma subsidiária.
Porém, os cinco artigos e seus respectivos incisos, são insuficientes para regulamentar essa nova modalidade de trabalho, sendo incipiente, até o momento, as decisões da própria Justiça do Trabalho.
Com a pandemia, é indiscutível que tal modelo de trabalho se expandiu de forma rápida e repentina, trazendo mudanças irrefutáveis nas relações de trabalho e emprego, bem como questões significativas que carecem de regulamentação, a fim de garantir segurança jurídica esperada pelas empresas.
Segundo a Fundação Instituto de Administração (FIA), desde abril de 2020, 43% das empresas situadas no Brasil adotaram o regime de trabalho à distância, número crescente até o presente momento.
De qualquer forma, é impossível negar que tal modalidade de trabalho trouxe inúmeros benefícios, mas também não podemos descartar o risco para o empregador, inclusive no que diz respeito as questões inerentes às condições ergonômicas, jornada de trabalho, diversos problemas psicológicos que surgiram decorrentes da jornada de trabalho, excessiva para alguns, e a responsabilidade por eventuais acidentes domésticos.
Ao transferir o trabalho para o cenário doméstico, o empregador deve desenvolver e adotar medidas para tornar o novo ambiente produtivo, equilibrado e principalmente seguro, evitando desdobramentos futuros, inclusive na esfera judicial.
Uma medida jurídica preventiva é a assinatura de um termo aditivo ao contrato de trabalho, que deve discriminar as atividades que serão desenvolvidas, horário de trabalho e eventuais pausas/intervalos, correlatos à cada função, a infraestrutura fornecida (ex.: computador, celular coorporativo etc.), eventuais gastos custeados pelo empregador, bem como a manutenção dos benefícios que já eram concedidos, quando instituído por força de acordo/convenção coletiva, desde que vigente à época.
Cabe aqui uma questão jurídica relevante, relacionada com a manutenção do vale refeição, de ampla discussão, haja vista que fornecido para que o empregado se alimente durante sua jornada de trabalho, durante o intervalo intrajornada. Mas se o empregado executa trabalho remoto deve permanecer recebendo o vale refeição? Certamente a discussão jurisprudencial será ampla e com entendimentos diversos.
Outro tema relevante é o direito do empregador efetuar a avaliação do local de trabalho por meio remoto, com autorização expressa do empregado, oportunidade em que deverá avaliar o cumprimento das medidas de prevenção da saúde e segurança no trabalho, previstas na legislação. Neste sentido, a recusa do empregado às vistorias em seu local de trabalho implicará a isenção de responsabilidade da empresa pela reparação de acidentes de trabalho ou doenças ocupacionais, que porventura venham a ocorrer.
As empresas devem ter em conta que não há normas regulamentadoras de proteção ao trabalhador, que visem assegurar as cautelas sanitárias pertinentes às particularidades de cada atividade laboral, classificadas como de altíssimo, alto, médio e baixo risco.
É necessário que o empregador mantenha o poder diretivo, ainda que em razão da pandemia, embora a realidade contratual tenha sido alterada. Dessa forma, devem ser mantidas as reuniões de equipe para que a equipe permaneça interagindo, a fiscalização do horário de trabalho, que pode ser implementada de forma digital nos computadores, por meio de login e logout, fornecer aos empregados informações acerca de prevenção de acidentes, a importância de ginástica laboral.
Nos termos do artigo 157 da CLT, é dever do empregador, independentemente do regime adotado, cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, no sentido de evitar acidentes ou doenças ocupacionais.
Porém, como proporcionar e adequar as regras de segurança e saúde do trabalho também para o ambiente doméstico? Como se certificar que os colaboradores estão cumprindo com o que determinado? São inúmeras questões com poucas respostas neste momento, ainda pendentes de legislação que disponha a respeito, considerando que o teletrabalho não abrange todas as questões abrangidas pelo trabalho em home office, principalmente pela ausência de posicionamento dos nossos Tribunais.
Outro ponto importante é observar a proteção dos dados fora do ambiente coorporativo, ou seja, longe do domínio da empresa, evitando assim infrações à Lei Geral de Proteção de Dados – LGDP, que se tornou obrigatória em 01/08/2021. Para tanto é necessário não só apenas o treinamento, conscientização da equipe e a formalização de termo de responsabilidade quanto à manutenção do sigilo referente às atividades desempenhadas, como também a implantação de políticas/procedimentos internos e a utilização de mecanismos tecnológicos que visem a segurança e dificultem o vazamento de dados confidenciais e sigilosos.
Porém, mesmo com todos os cuidados descritos acima, ainda há riscos do empregador se tornar automaticamente suscetível e responder por fatos que não deu causa, um bom exemplo seriam os acidentes domésticos caracterizados como acidente de trabalho, afinal de contas a residência do empregado tornou-se seu local de trabalho.
Neste sentido também é necessário preservar a imagem do empregado e daqueles com quem divide moradia, portanto não é lícito ao empregador obrigar ao empregado que mantenha a câmera de seu computador ligada, vez que o local de trabalho é residência do empregado e com ele podem residir outras pessoas, além disso poderá estar alocado em ambientes compartilhados de sua residência para trabalhar.
De toda a forma, o empregador pode, e deve adotar medidas protetivas, tais como: palestras online, concessão de aparelhos ergonômicos (a depender da natureza da atividade), termo de responsabilidade e ciência acerca das questões inerentes a segurança e saúde, jornada de trabalho, circularização de folders informativos, manual de boas práticas no ambiente de trabalho, entre outras.
Enfim, é necessário tomar todos os cuidados devidos, a fim gerenciar eminente risco, resguardar direitos e afastar eventual responsabilidade ou omissão por parte do empregador.